terça-feira, 25 de outubro de 2011

Castigo Medieval

Senador defende no Congresso que presos que não trabalham devem ser chicoteados. Proposta contraria Constituição e tratados internacionais, e é criticada por especialistas





O senador Reditário Cassol (PP-RO) defendeu no Congresso Nacional a volta do trabalho forçado no Brasil. Ao anunciar que pretende apresentar um projeto para alterar o Código Penal, o parlamentar afirmou que todos os criminosos deveriam “estar atrás da grade de noite e, de dia, trabalhar”, sendo que, os que não concordassem em realizar atividades laborais durante a pena, deveriam receber “o chicote, que nem antigamente”.


A proposta contraria não só a Constituição Federal de 1988, lei máxima do País, como também convenções internacionais das quais o Brasil é signatário. É o caso da Convenção 29, da Organização Internacional do Trabalho, que prevê que “todos os membros da Organização Internacional do Trabalho que ratificam a presente convenção se obrigam a suprimir o emprego de trabalho forçado ou obrigatório, sob todas as suas formas, no mais curto prazo possível”, e estabelece que trabalho forçado é “todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de qualquer penalidade e para o qual ele não se ofereceu de espontânea vontade”.


Apesar de não haver base jurídica para aplicação de castigos físicos a presos, Reditário Cassol afirmou esperar total apoio dos demais senadores. No Senado, onde ocupa a vaga do filho, o ex-governador de Rondônia Ivo Cassol, licenciado, o suplente não teve apoio dos colegas. Logo após defender que os presos brasileiros sejam chicoteados, foi criticado pelo senador Eduardo Suplicy (PT/SP), que afirmou que “de maneira alguma aprovaria a utilização do chicote, porque seria uma volta à Idade Média”.


Além de outros senadores, especialistas em Direito Penal e Trabalhista também criticaram a ideia de se castigar presos. “O trabalho sob ameaça de chicotes, como pretende implantar o senador Cassol, nos remete ao período em que o trabalho era considerado uma punição ou parte da pena, cujo objetivo era trazer sofrimento e aflição ao condenado. Naquela época, se o apenado se recusava, ele era coagido, inclusive sob o uso de tortura e outros castigos físicos, a executá-lo”, aponta Sâmara Rios, professora universitária mestre em Direito do Trabalho pela Universidade Federal de Minas Gerais e analista judiciária do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. “Retomar essa fase sombria da história significa regredir e ignorar a evolução em termos de direitos humanos incorporada pela Carta Magna e pelos diplomas internacionais”, completa, destacando que o trabalho hoje é visto como parte importante do processo de ressocialização do preso.


Em um artigo acadêmico sobre o tema, o advogado Pedro Augusto Gravatá Nicoli, também mestre em Direito do Trabalho, ressaltou a importância de se apresentar o trabalho como uma opção ao preso. Isso é importante para “a reabilitação do indivíduo encarcerado, para que aceite conscientemente as regras seguidas em sociedade”. Quem estuda a questão aponta que, ao contrário do que espera Cassol, a ideia de se impor trabalho forçado só prejudica os demais membros da sociedade, já que tortura torna mais difícil a recuperação de detentos.

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