sexta-feira, 9 de março de 2012

E aí, vai encarar?

O que era para ser motivo de realização e melhora na autoestima pode se tornar um pesadelo. Saiba como evitar complicações com cirurgias plásticas
Raul Andreucci


A cirurgia plástica pode partir de duas motivações: saúde e estética. Ambas, porém, passam pelo mesmo problema: não são completamente seguras. Podem ocorrer erros médicos, falhas decorrentes da qualidade dos produtos e até imprevistos na reação do próprio corpo após a intervenção. E o que vem depois disso, em vez de ser a realização de um sonho, pode se tornar um pesadelo. Um exemplo disso é o caso da esteticista gaúcha Jany Simon Ferraz, de 54 anos, de São Gabriel. Assim como muitas mulheres no mundo todo, ela teve problemas com a prótese mamária de silicone colocada logo após a retirada de um tumor maligno. Jany até considerou a marca indicada pelo convênio, mas, por insistência do cirurgião, pagou o triplo para ter as próteses da francesa PIP (Poly Implant Prothese). Na época, ainda não se sabia que os produtos da empresa estavam adulterados, com composição inapropriada para contato ao corpo humano.


Das cerca de 25 mil brasileiras que colocaram implantes da PIP, a esteticista está entre as que o silicone vazou. Após três cirurgias, ela ainda sofre com dores e febre decorrentes do problema. "Estou há 7 meses em tratamento com corticoide, aguardando alguma solução da Justiça, e rumo à minha quarta operação. Sinto-me totalmente impotente, desorientada, sem nenhum apoio. A autoestima vai por água abaixo", conta.




A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proibiu a importação, distribuição, comércio e utilização das próteses da PIP em abril de 2010. Na época, indicou às pacientes que procurassem seus médicos e tranquilizou a população: nada de pânico. Só no final do ano passado, quando surgiu a notícia da primeira morte em razão do silicone da marca, o órgão apressou-se em determinar o recolhimento das próteses. E agora, em janeiro, decidiu pelo cancelamento do certificado, o que não é considerado ideal pela Associação de Vítimas da PIP, grupo de mulheres que está se organizando para reivindicar seus direitos. "A Anvisa, assim como todos os órgãos no Brasil, não consegue assumir responsabilidade. E ainda inverte a mesa para colocar a culpa nas ‘burras’ que resolveram fazer a cirurgia", reclama a farmacêutica curitibana Fernanda Cury, uma das que colocou a prótese por estética e endossa o coletivo.


O advogado Vinicius Simony Zwarg, especialista em direito do consumidor, contesta a oferta de só trocar as próteses de quem já teve câncer ou a prótese rompida. "O simples fato de haver o risco já justifica a cirurgia. É como se fizéssemos um recall de carro, em que há uma chance de quebra das peças e as trocas só são oferecidas para depois do acidente", observa. "Não faz sentido. A Anvisa contribuiu para o dano, tem de responder por isso. O governo parece que agora faz vista grossa para a legislação", completa o advogado.


O escândalo internacional envolvendo as próteses da PIP reacendeu a dicussão sobre a segurança desses procedimentos. Ainda mais no Brasil, que ocupa o segundo lugar no ranking de países que mais realizam cirgurgias plásticas. Por ano, são feitas cerca de 700 mil: 60% por estética e 40% reparadoras. As que lideram a lista são de implante mamário de silicone (40%), lipoaspiração (30%) e intervenções na face (20%).


Casos de complicações que vem a público servem de alerta para aqueles que pensam em modificar alguma parte do corpo, como o modelo Bruna Felisberto, eleita Miss Rio Grande do Sul em 2009. Aconselhada por quem a assessorava antes da disputa pelo título de Miss Brasil, naquele mesmo ano decidiu passar por uma cirurgia plástica no nariz. "Ele dizia que meu nariz deveria ser diferente, não fotografava bem", explicou em entrevista ao programa "Repórter Record", em junho do ano passado. O nariz ficou com uma cicatriz, uma espécie de depressão, a voz ficou anasalada e a gaúcha ainda teve sérios problemas de respiração. "Hoje sou traumatizada por causa disso... Era satisfeita com a minha imagem", contou.


Para evitar esse tipo de situação, é imprescindível ter certeza do procedimento. "A opção por transformar um pedaço do corpo que gera infelicidade, por menor que seja, é uma escolha importante", explica Ana Bock, psicóloga e professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). O secretário-geral da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), Dênis Calazans, vai além: "Não se pode fazer por modismo".


E casos malsucedidos podem provocar até a morte. Durante lipoaspiração em 2010, em uma clínica de Brasília, a jornalista Lanusse Martins morreu aos 29 anos por erro médico.


Para reduzir o risco, recomenda-se procurar os especialistas. A lei permite a qualquer formado em Medicina realizar cirurgias plásticas, mas segundo estudo do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), 97% dos processados por erro médico entre 2001 e 2008 não tinham essa especialidade. Apesar dos muitos benefícios, ao que parece, a cirurgia também pode dar muita dor de cabeça se não se toma os devidos cuidados.




Casos extremos


Cirurgia plástica e tratamentos estéticos mais invasivos já levaram pessoas à morte, provocaram casos dramáticos e também situações bizarras. No Rio de Janeiro, uma mulher teve partes do bumbum necrosado em tratamento para celulite e aumento dos quadris numa clínica estética. "Eu não posso mais fazer as coisas que fazia antes, botar roupa de academia para malhar, colocar biquíni ou ir à praia", disse a vítima ao portal "R7", sem querer se identificar.


Nos Estados Unidos, no fim do ano passado, veiculou-se a notícia de um falso médico que fazia cirurgias estéticas, aplicando cimento e cola em glúteos, lábios e bochechas. Segundo a imprensa local, o transexual Oneal Morris, que atuava como cirurgião plástico em quartos de hotel, teria injetado material tóxico em seu próprio corpo, tal como mostrou foto divulgada pela polícia após sua detenção. Uma vítima chegou a denunciar Morris, dizendo que foi hospitalizada com pneumonia e uma infecção bateriana depois de ter recebido selador de pneus de carro nas nádegas.


Em 2010, no Rio Grande do Sul, uma mulher quis diminuir os seios e retirar gorduras da barriga. Além de diversas cicatrizes, ficou sem o umbigo.


De vez em quando, médicos irresponsáveis, que tentam aumentar os ganhos se aventurando numa área em que não são especialistas, acabam pegos. Foi o que aconteceu com Joacir Rodrigues Carvalho, no Mato Grosso, no começo deste ano. Por erro médico, foi condenado a 2 anos e 2 meses de prisão e R$ 20 mil de indenização para a paciente que teve problemas de cicatrização na barriga.


Denísio Marcelo Caron, de Brasília, também foi para a cadeia em 2002 pela morte de cinco mulheres. Apesar de ser formado em Medicina, ele estudou em faculdade com baixa avaliação do Ministério da Educação e não foi aceito na Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.


Todo cuidado é pouco


Siga as orientações de especialistas para minimizar o risco de complicações


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