domingo, 5 de agosto de 2012

Loucuras de Fã

Motivadas pela paixão, há pessoas que não medem esforços para ficar perto dos ídolos que as fascinam

Todos nós temos admiração por algum cantor, jogador de futebol ou artista de televisão. Gostamos de saber sobre os assuntos que dizem respeito a eles e, muitas vezes, compramos revistas ou CDs para ficarmos atualizados. Nada diferente do comportamento de um fã normal. Mas há casos em que o amor pelo artista é maior. Para esses, enfrentar dias numa fila para assistir a um show ou gastar o que for necessário para conseguir um autógrafo ou uma foto com o astro é o mínimo em uma lista que inclui até tatuar o próprio corpo com o nome ou imagem do ídolo.

A modelo e atriz Poliana Andréia dos Reis, de 22 anos, que mora em Mogi Guaçu, no interior paulista, já perdeu as contas de quanto gasta por mês por causa do jogador Neymar, atacante do Santos: "Todo dia compro jornal de esportes para ver se ele está lá. Também compro revistas. Se vejo camisetas, caderno ou algo com a foto dele, que ainda não tenho, compro na hora. Fico sempre de olho na loja virtual dele pra saber se tem algum produto novo. Só com revistas e jornais gasto de R$ 300 a RS 400 por mês".

Mais que gastar dinheiro com Neymar, Poliana investe tempo diante do computador em busca de notícias sobre o craque. Integrante do fã-clube das Neymarzetes, ela admite ficar 24 horas ligada em tudo que diga respeito ao jogador. "Olho no site dele, "Twitter" e "Facebook" pra ver se fico sabendo de algo. Só paro para trabalhar e, às vezes, esqueço até de comer, de ficar com a família, de sair. Acabei deixando de conviver com amigas por me dedicar tanto a isso", conta.

Sua maior loucura por Neymar, conta Poliana, foi no ano passado, quando ela foi até Santos, na Baixada Santista, para assistir a um jogo: "Eu tinha ganho os ingressos, mas precisava de dinheiro para a passagem. Como não tinha, fui pedindo emprestado para todo mundo que conhecia para conseguir comprar. Meu objetivo era tentar conhecê-lo", relata, acrescentando ter contado com a ajuda de duas amigas para fazer o presente que queria entregar: uma carta gigante com quase 300 metros de comprimento. "Depois do jogo tentei entregar a carta pessoalmente, enfrentei chuva das 7 da manhã até de tarde, mas os seguranças não deixaram. Chorei muito e eles acabaram entregando por mim. Mas só fui conhecê-lo um bom tempo depois, após um jogo no Pacaembu (na capital paulista). Consegui entrar onde a imprensa fica, conheci o pai dele, conversamos, mostrei minha tatuagem (Poliana tem cinco tatuagens em homenagem ao astro) e pedi para ele me ajudar a conhecer o Neymar. Ele me deixou entrar na van onde ele estava. Foram os 5 minutos mais importantes da minha vida!", exagera a moça.

O cantor de sertanejo universitário Luan Santana é outro que conquistou fãs em todo País e até no exterior. Uma delas é Nayara Batista, de 21 anos, estudante de direito, que se declara fanática por ele. Ela é mais uma prova de que as fãs são capazes de realizar loucuras pelos ídolos: "Sou a primeira fã do Luan a tatuar o rosto dele (Nayara fez a tatuagem na perna). Já enfrentei 7 horas de viagem para ir a show dele, ouvir três músicas e voltar. Tudo isso depois de 1 dia duro de trabalho. Quando voltei, tive que ir trabalhar. Mas valeu a pena, pude ver o sorriso do Luan e isso me deu forças pra enfrentar tudo", relata a moça.

Nayara diz que sua maior dificuldade como fã é enfrentar o preconceito das pessoas. "Quando fiz minha tatuagem, uma pessoa pegou a foto e postou numa rede social falando mal de mim, criticando minha atitude. Deu bastante repercussão, a foto teve mais de 7,5 mil compartilhamentos e muitos comentários me xingando e me humilhando", revela.

Poliana também sentiu o preconceito após fazer a tatuagem em homenagem a Neymar. "Meu irmão ficou sem falar comigo e brigava com a minha mãe por minha causa, dizendo que era culpa dela eu ser louca pelo Neymar. Todo dia pelo Facebook alguém vem me criticar, me chama de maluca, de doida. Eu ignoro."

O amor pelo ídolo muitas vezes influencia até nos hábitos de algumas fãs. É o caso de Estéfani Abiaquila da Silva Almeida, de 24 anos, apaixonada por Thiaguinho, ex-integrante do grupo Exaltasamba. "Quando soube que o prato preferido dele era feijoada, passei a comer mais", revela. "Agora, todo ano, no meu aniversário, faço feijoada e reúno os amigos e a família."

A rotina de Poliana também mudou por causa do Neymar. "Fico quase o dia inteiro na internet. Também comecei a escutar as músicas que ele gosta, como pagode e sertanejo, passei a ir a shows desses artistas e a comer batata frita, pois sei que o Neymar também gosta."

Todas as fãs ouvidas pela reportagem disseram contar com o apoio da família para realizar os sonhos de fã. Para Nayara, o porto seguro é a mãe. "Ela me entende em tudo, ela e minha filha de 4 anos são as únicas que me aguentam falando do Luan o dia inteiro", comenta. "Meu pai não gosta muito de eu ser tão fã do Luan, mas não fala nada, às vezes até me ajuda a comprar alguma coisa."

Estéfani também conta com o apoio da família e amigos, que já ajudaram a comprar ingressos, por exemplo. Poliana tem mais dificuldade. "Minha família inteira é corintiana e às vezes eles ficam bravos por eu gostar tanto do Neymar."

Quando vira doença

Manifestar amor a uma pessoa famosa tem limites, mas há quem não se importe em ultrapassá-los. É o caso de uma fã russa da cantora Lady Gaga, que disse por carta que queria matá-la – e que depois se suicidaria. Motivo: assim as duas poderiam ficar juntas após a morte.

Em um trecho da carta, escrita em 2010, Anastásia Obukhov, de 28 anos, disse: "Você é minha deusa, sonho contigo toda noite. Na Terra, não sou nada para você. Quero morrer, mas morrer contigo. Talvez no céu você me dedique um minuto de seu tempo". Gaga pediu à Justiça para que a "fã" fique a pelo menos 500 metros de distância dela e a segurança dos shows foi reforçada.

Outros fãs também exageram na hora de demonstrar que amam celebridades. Uma delas, fanática pelo cantor Justin Bieber, usou um estilete para escrever no braço "JB I Love" (Eu amo Justin Bieber), tirou uma foto e a postou na internet. Há ainda quem tenha tatuado o nome do ídolo no próprio rosto, caso de um fã do cantor Drake e outro fã da cantora Lady Gaga. A psicóloga clínica hospitalar Rita Dantas explica que, em princípio, ser fã é algo normal e inofensivo, mas quando começa a colocar em risco a própria segurança, ou de outra pessoa, se torna algo perigoso. "Há casos patológicos, onde o fanatismo transforma-se em doença e o fã assume até mesmo um comportamento criminoso."

Frustrações, inseguranças, falta de autoconhecimento e carência afetiva são coisas que podem levar a pessoa ao fanatismo, diz a Rita. "A pessoa acha que não tem condições pessoais para se autorrealizar e desenvolve ansiedade, depressão e isolamento. Ela vai percebendo que há um vazio e tenta preenchê-lo com as características do ídolo. Só que esse vazio não é preenchido porque quem tem esses atributos é o outro", completa ela.

Na avaliação da psicóloga, a relação da pessoa com o objeto de admiração acaba sendo equivalente à de uma relação amorosa. É preciso paciência e apoio da família para tratar o problema. Reprimir ou zombar só piora a situação. "Num primeiro momento, a família deve buscar auxílio psicológico. Depois, a recuperação se dá pelo fortalecimento da autoimagem, levando-a a definir sua identidade. É preciso orientar esses jovens que, nessa fase da vida, precisam mesmo é de atenção da família", diz a psicóloga.

Paixão já dura 3 décadas

Depoimento de Edna revela que não só adolescentes investem tempo e dinheiro para se aproximar dos ídolos

"Comecei a ter um ídolo em 1979 assistindo ao seriado Chip’s. Os anos se passaram e, em 1984, chegava ao Brasil o grupo Menudo, formado por cinco adolescentes de Porto Rico. Mal falavam o português, cantavam em espanhol e inglês e eu me apaixonei. Fui a vários shows. Em 1985, eu estava no Estádio do Morumbi, em São Paulo, quando o grupo alcançou o recorde de 200 mil pagantes. Desde então, o menudo fez e faz parte da minha vida.

Na época era difícil vê-los pessoalmente, teria de pagar fortunas para ir a um encontro. Para mim, era impossível. Continuei com minha admiração durante anos, sem a mesma intensidade da década de 1980. Foi em 1999, quando comprei meu primeiro computador, que voltei a procurar notícias dos meus ídolos. Na época, eu morava no Japão e soube que o Ricky Martin faria shows por lá. Fui e não parei mais. Toda a emoção da menudomania voltava aos poucos e pude realizar sonhos que haviam sido impensáveis na minha juventude.

Conheci Porto Rico em 2001 e já fui mais de 20 vezes para lá assistir a shows do Ricky Martin, Draco Rosa e do grupo El Reencuentro (formação dos ex-integrantes do Menudo: Ricky Melendez, Charlie Massó, Ray Reys, Johnny Lozada, René Farrait e Miguel Cancel).

Já fui ver o Ricky Martin no Uruguai, na Argentina e até nos Estados Unidos. Em junho, estive na Broadway, em New York, para vê-lo atuar na peça Evita. Para ver o El Reencuentro, eu já fui para a Venezuela e para o México.

Mais que realizar meu sonho, hoje trabalho com eles para a divulgação de shows e encontros com fãs. Quando vou a espetáculos no exterior, sou sempre bem recebida por eles. Esse reconhecimento é o melhor presente que um ídolo pode dar a seu fã."

Edna Akemi, 43 anos, produtora de eventos

*Colaborou Rafaella Rizzo

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