Sou brasileiro: viajar é comprar
Economia estável e dólar baixo alavancam a fama de turista
gastador. Novo sacoleiro traz do exterior mais eletrônicos, roupas de
grife e produtos que aqui são caros. Compras lá fora batem recorde: R$
6,9 bilhões
A cada pouso a
cena se repete. Os rostos felizes em função do retorno ao País em meio a
gestos atrapalhados pelo peso dos carrinhos que carregam malas e mais
malas cheias de eletrodomésticos, eletrônicos, roupas e outros tipos de
itens comprados no exterior. Nos primeiros 2 meses desse ano, os gastos
feitos durante viagens fora do País bateram recorde e chegaram a US$ 3,7
bilhões, o equivalente a R$ 6,9 bilhões. Além da valorização do real,
impostos e custos de fabricação mais baixos fazem com que alguns
produtos comprados lá fora saiam por menos da metade do preço.
O empresário Ricardo Martinez conta que
comprou praticamente todo o enxoval do filho que está prestes a nascer
em suas viagens ao exterior. "Dessa vez só trouxe o carrinho, porque
antes já havia trazido outros itens", conta.
A professora
de educação física Gabriela Bacelle também aproveitou a viagem para
trazer presentes para seu filho, de apenas 9 meses. "Eu queria comprar
esse carinho, mas aqui ele custa muito caro. Lá paguei o equivalente a
R$ 120 reais. É um absurdo a diferença", diz, indignada, ao desembarcar
de uma viagem de 10 dias para Boston, nos Estados Unidos.
"Dá vontade de
comprar tudo", conta Roger Takara, cercado por malas. Ele viajou com um
grupo de amigos e familiares por diversos parques norte-americanos. "Só
não trouxe um carro porque não cabia na mala. Os parques foram
pretextos para comprar", brinca. O estudante Matheus Takara aproveitou
para comprar raquetes de tênis. Ele conta que pagou US$ 134 em cada uma
delas, o equivalente a cerca de R$ 245. No Brasil, elas custariam entre
R$ 650 e R$ 700. A cabeleireira Harumi Nadire, que também viajou com o
grupo, conta que comprou até liquidificador. "Tudo vale muito a pena.
Pagamos um pouco de excesso de bagagem, mas ainda assim compensou",
afirma.
Nos últimos
anos, a renda dos brasileiros aumentou. Mais pessoas passaram a consumir
serviços, produtos eletrônicos e alimentícios que antes só eram
acessíveis a um grupo econômico bem restrito. Com mais dinheiro no
bolso, os brasileiros também passaram a viajar mais e a comprar cada vez
mais no exterior. Além dos bens materiais que trazem nas malas, há
gastos com coisas que não podem ser transportadas em aviões, como
imóveis: os brasileiros são os principais compradores de imóveis acima
de US$ 1 milhão em Miami, nos Estados Unidos. O consumo dos "brazucas"
inclui ainda lazer e alimentação, como indica o empresário Stélio
Robusti: "Não compramos muitos eletrônicos, mas nos divertimos muito.
Você fica em hotéis maravilhosos que, às vezes, são mais baratos que os
do Brasil. Ou seja, muitas vezes compensa mais você fazer uma viagem ao
exterior do que viajar por aqui", acredita. Robusti passou 10 dias com a
mulher em Las Vegas e, além dos gastos com diversão, também aproveitou
para comprar roupas.
Tudo tem limite
Apesar das
facilidades para comprar, é preciso lembrar que a Alfândega impõe
limites. Apenas nos 3 primeiros meses deste ano foram apreendidos bens
com valores correspondentes a R$ 405,4 milhões.
O Brasil vai bem, mas...
"O fato de
estar consumindo mais é o resultado do sucesso da economia brasileira.
As pessoas entram no supermercado e produtos que antes nem pensavam
passam a ser possíveis. Esse é o lado positivo. O negativo é que quanto
mais importamos, menos consumimos o que é produzido aqui. E isso afeta a
produção nacional e gera desemprego", diz o economista Antonio Carlos
Alves dos Santos, professor da Pontifícia Universidade Católica. Segundo
ele, as taxas de impostos, o custo do trabalhador e a logística do País
produzem um elevado "custo Brasil". Ele explica que as medidas lançadas
pelo Governo Federal no inicio do mês para incentivar vários setores
industriais a se tornarem mais competitivos, em tese, favorecem a
produção interna, o que leva à redução da diferença de preços. Mas ele
vê esse tipo de medida com ressalvas. "O que se está fazendo é diminuir
os impostos que essas empresas pagam. Mas o governo vai buscar essa
verba de outras fontes. E aí, quem vai pagar essa diferença?", provoca.
O economista
alerta para a necessidade de investimentos em infraestrutura, o que
aumentaria a eficiência da produção no País. "Como se faz para
distribuir produtos sem uma rede ferroviária ampla e eficiente, e com
estradas esburacadas e portos destruídos?"
Fonte: F.U
Fonte: F.U
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