sábado, 18 de agosto de 2012

Sem Amigos, Não dá

Pesquisas mostram que laços de amizade melhoram o humor, curam doenças e aumentam em até 10 anos a expectativa de vida
Içara Bahia



Laços fortes de amizade melhoram o humor, previnem doenças, aumentam o rendimento no trabalho e fortalecem até o sistema cardiovascular. Sem contraindicação, a amizade dispensa receita médica, tem efeito imediato e – de tão importante que é – tem até data comemorativa. Festejada sempre no final de julho, a data é uma referência ao marco histórico da chegada do homem à Lua, em 1969, e foi escolhida pelo dentista e professor argentino Enrique Ernesto Febbraro. Ele acreditava que o momento seria oportuno para o surgimento da amizade entre todo o Universo. A comemoração foi oficialmente instituída na Argentina por meio de um decreto (nº 235/1979) e, aos poucos, foi se espalhando por todo o mundo. Pela criação do Dia do Amigo, Febbraro foi indicado ao Prêmio Nobel duas vezes. 

Ele não ganhou o prêmio, mas incentivou o surgimento e o fortalecimento das amizades verdadeiras, tão valiosas quanto qualquer tipo de premiação. Para o pesquisador Tom Rath, psicólogo do Instituto Gallup, nos Estados Unidos, fortalecer as relações com amigos, colegas de escritório, parentes e parceiros é um grande investimento para a felicidade. 


Rath estudou os impactos da amizade na vida das pessoas e constatou que, além de aumentar a satisfação diária, melhora a saúde, cura depressão e ainda evita momentos de estresse. Entre os resultados, Rath observou, também, que quem tem grande amigos no emprego possui sete vezes mais chances de se dedicar ao trabalho e de aumentar o nível de produtividade. O resultado da pesquisa foi transformado em livro, publicado no Brasil com o título “O poder da amizade”, da editora Sextante, com tiragem esgotada no País. 

Quando a amizade é mantida ao longo dos anos, a felicidade é ainda mais benéfica e sadia. Arianne Dantas Ferri tinha 15 anos quando precisou mudar de colégio. Ela ainda não conhecia os colegas de classe quando foi chamada por uma jovem para integrar um grupo de trabalho. “A princípio, achei que ela era muito marrenta”, conta hoje a administradora de empresas. A colega era Liliane da Cruz, na época também com 15 anos, que se tornou amiga de Arianne graças a uma confidência guardada a sete chaves. “Eu contei para ela sobre um menino de quem eu gostava. Ficava ligando para ela, pedindo para não contar nada a ele. Depois disso, não deixamos de nos falar”, contou Liliane. Arianne guardou bem o segredo e a confiança entre elas é mantida há 12 anos.


“Além da confiança, existe sinceridade e respeito. Somos bem diferentes uma da outra, mas sei que ela sempre vai estar ao meu lado e vice-versa. A amizade é como um porto seguro, é ter alguém com quem você pode sempre contar”, define Arianne. “Uma está do lado da outra o tempo inteiro. Saímos da escola, ficamos adultas, escolhemos profissões diferentes e, ainda assim, continuamos muito amigas. Ao longo desses 12 anos, a amizade nunca esfriou”, acrescenta Liliane, hoje com formação em química. 

Para o psicólogo e escritor Alexandre Bez, especialista em Relacionamento pela Universidade de Miami (EUA), a amizade verdadeira é sempre livre de interesses. “É aquela em que a preocupação com o outro está em primeiro lugar. Existe sempre o respeito. Os amigos precisam compartilhar as mesmas ideias ou respeitar a ideia do outro, quando ela for diferente. Você sofre junto, fica alegre junto”, explica ele, autor do livro “Inveja – o inimigo oculto”.



O psiquiatra americano George Vaillant, da Universidade de Harvard, conduz uma pesquisa sobre os motivos que levam as pessoas a serem felizes e saudáveis há mais de 3 décadas. O estudo, que teve início em 1937 e continua até os dias atuais, mostrou que pessoas de personalidade tranquila, com senso de humor e com uma rede de amigos fortalecida podem viver mais e com mais saúde. Os laços de amizade podem aumentar a expectativa de vida em até 10 anos e ainda previnem contra doenças. 

Outra pesquisa, realizada pela Universidade de Brigham, nos EUA, mostrou que a amizade, além de promover a longevidade, pode aumentar em até 50% a taxa de sobrevivência de um indivíduo diante de adversidades à saúde mental e física. A falta de amigos, informa o estudo, é tão prejudicial quanto o alcoolismo ou tabagismo. 

Para manter uma relação sincera e verdadeira, não é preciso estar sempre ao lado fisicamente. Com o advento das redes sociais, os laços são mantidos mesmo a longas distâncias. Doutora em psicologia pela Universidade de São Paulo (USP), Lívia Godinho Nery Gomes estudou as relações mediadas na internet e garante que é possível ter amigos virtuais. E vai além: é possível ter amigos com os quais nunca se esteve face a face. 



“A amizade é um relacionamento que se dá cada vez mais no âmbito do compartilhamento e troca de ideias. O amigo não é necessariamente aquele que está ao lado, mas alguém com quem o estar junto se dá através da conversa, da permuta de opiniões, experiências e concepções de pensamento”, afirma.

A tese da pesquisadora, intitulada “Implicações políticas das relações de amizade mediadas na internet”, mostrou que a força do afeto entre pessoas que nunca se conheceram presencialmente é o resultado da possibilidade e capacidade de compartilhar experiências. “E mais do que isso, os sujeitos falam do inestimável valor do encontro com tais amigos na internet, da constância das prazerosas conversas on-line, dos sentimentos de carinho, confiança e mesmo de preocupação com o bem-estar um do outro”, diz a psicóloga, que é professora da Universidade Federal de Sergipe (UFS).

O assistente financeiro Kellygston Marques Taylor Gomes Martins, de 23 anos, mora em Belo Horizonte e, mesmo distante, não deixa de manter contato com o amigo Rodrigo Gonçalves Dias, de 25, que mora em São Paulo. A amizade entre eles, fortalecida diariamente pela internet, nasceu de uma forma curiosa, por meio de uma ligação telefônica. 

Kellygston trabalhava em uma empresa de telefonia e, por conta disso, possuía cota de ligações gratuitas. Ciente disso, um amigo pediu para que ele ligasse para Rodrigo. Ele ligou e, ao invés de passar o telefone para o amigo, engatou uma conversa com o desconhecido do outro lado da linha. “A ligação durou quase 20 minutos. Eu não o conhecia, mas ficamos conversando”, contou Rodrigo.

Passados 5 anos, os dois mantêm uma relação de confiança. “Com algumas pessoas, a amizade não é mantida. No nosso caso, mesmo com a distância, continuou, pois é uma relação sincera e atenciosa”, afirma Kellygston. Para ele, amigo é aquele que não mede esforços para se dedicar ao outro. “Os laços são como o de uma família. Sem amigo a gente não consegue viver.”

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